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TEXTOS DA SEMANA

INSTANTE DE FEBRE

Badalam os sinos, e ele sai, pois os dias são frouxos. O pecado é sempre soberbo e vaza pelas bordas do prato, pois aquilo que engorda também mata. Vive por onde ninguém anda e anda por onde ninguém vive. Seus dias são dias de desertos áridos, frios e banhados de solidão. Soam os sinos, e ele, já bêbado, retorna para a solidão do lar. Todos os dias, ele acorda às manhãs, bota sua bermuda amarrada por um cordão à cintura, já que o botão caiu há tempos, ele apanhou do chão, debaixo da geladeira e colocou-o ao lado da solidão dos livros, para pregá-lo e nunca mais pregou. Cedo faz suas orações, passa seu café e fuma seu primeiro cigarro. Demora-se um pouco, sentado em sua cadeira que fica na área de serviço, depois vai preparar seu almoço, botar comida para os seus pássaros, colocar ração para a sua cadela e milho para os seus patos e para as suas galinhas, enquanto o almoço fica pronto. Depois de todas as tarefas, da parte da manhã concluídas, banha novamente e desce para o bar, agora aposentado, onde fica até umas 4h da tarde, pois já não tem mais compromisso com horários. Aos sábados, ele toma café e almoça na banca da Raimunda, que fica no mercado onde ele adquire também: o queijo, a coalhada e o doce de leite caseiros, preparados por ela mesma. Lá, deixa as duas sacolas: uma para entregar à dona Efigênia, onde ela coloca suas frutas e suas verduras da semana, que as conhece de cor e salteado, e a outra, entrega ao seu Antônio, magarefe, onde ele põe as carnes da semana, pois sabe quais são as carnes e as quantidades, todas decoradas à memória. Peixe só se for tilápia ou surubim, porque têm pouca espinha. Pode ter se engasgado uma vez, quando criança, ficou com medo e com trauma de comer quaisquer peixes. Às 2h da tarde, volta para o almoço. Terminado de comer e de fumado seu cigarro, a Raimunda entrega, em dois pedacinhos de papel, os valores da dona Efigênia, verdureira, e do seu Antônio, magarefe, apesar de saber dos valores de antemão, ele sempre recebe os papeizinhos da mão dela, e paga-os. Despede-se, com as sacolas à mão, abre o bagageiro do seu Corcel 73, abóbora, quatro portas, que adquiriu logo após casar-se, onde se encontra uma caixa com seus apetrechos de pesca e uma bota velha, e, também, uma mochila velha, com um boné antigo, duas camisetas velhas e dois calções velhos, que são para uso nas pescarias. Aos domingos, ele vai ao sítio com os amigos para pescar, cantar, beber e se embriagar à vontade, até chegar o final da tarde. Domingo à noite, ele sempre tem febre, mas é um fogo leve, já que, logo depois do casamento, sua esposa faleceu e ele nunca mais casou-se. O coração secou com o tempo e as veias mucharam de dor e de saudade, diz ele, sempre que é indagado.

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